Contrato promessa de imóvel que o promitente vendedor declara que irá adquirir. Inobservância de formalidades. Perda do sinal. Boa fé. Perda objectiva do interesse na celebração do contrato. Incumprimento definitivo. Venda ulterior do imóvel a terceiro
CONTRATO PROMESSA DE IMÓVEL QUE O PROMITENTE VENDEDOR DECLARA QUE IRÁ ADQUIRIR. INOBSERVÂNCIA DE FORMALIDADES. PERDA DO SINAL. BOA FÉ. PERDA OBJECTIVA DO INTERESSE NA CELEBRAÇÃO DO CONTRATO. INCUMPRIMENTO DEFINITIVO. VENDA ULTERIOR DO IMÓVEL A TERCEIRO
APELAÇÃO Nº 2003/21.2T8LRA.C1
Relator: VÍTOR AMARAL
Data do Acórdão: 13-06-2023
Tribunal: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE LEIRIA
Legislação: ARTIGOS 5.º, 3 466.º, 5 E 609.º, 2, DO CPC; ARTIGOS 342.º, 1; 373.º E SEG.S; 394.º; 410.º, 1 E 3; 442.º; 762.º, 1; 763.º, 1; 777.º; 804.º, 1 E 2; 805.º, 1 E 2; 806.º, 1 E 2; 808.º; 879.º, C) E 892.º, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário:
1. – É valido o contrato-promessa pelo qual o promitente vendedor declara prometer vender um imóvel que irá adquirir (constituído por terreno para construção), incluindo uma moradia que ali irá edificar de acordo com projeto respetivo.
2. – A inobservância das formalidades previstas no art.º 410.º, n.º 3, do NCPCiv. – reconhecimento presencial das assinaturas e certificação de existência de licença de utilização ou de construção – constitui nulidade atípica/mista, que não é de conhecimento oficioso.
3. – Suscitada a questão da invalidade contratual, por via de tal inobservância de formalidades legais, apenas no recurso, razão pela qual a 1.ª instância dela não conheceu, trata-se de questão nova, de que a Relação não pode conhecer, por não constituir matéria de conhecimento oficioso.
4. – Só o incumprimento definitivo e não a simples mora desencadeia o mecanismo indemnizatório da perda do sinal (em singelo ou em dobro), que, na falta de convenção em contrário, é a única indemnização pelo incumprimento da promessa.
5. – O princípio da boa-fé revela determinadas exigências objetivas de comportamento – de correção, honestidade e lealdade – impostas pela ordem jurídica, exigências essas de razoabilidade, probidade e equilíbrio de conduta, em campos normativos onde podem operar sub-princípios, regras e ditames ou limites objetivos, postulando certos modos de atuação em relação, seja na fase pré-contratual, seja ao longo de toda a execução do programa contratual, seja mesmo, extinto o contrato, na liquidação do relacionamento entre as partes.
6. – A parte que invoca perda objetiva de interesse na celebração do contrato prometido tem o ónus da alegação e prova da factualidade de suporte de tal perda objetiva de interesse, que tem de ser aferida segundo um critério de razoabilidade.
7. – Se o promitente comprador invoca, infundadamente, para efeitos resolutivos – tendo comunicado a resolução ao promitente vendedor –, a perda de interesse na prestação e o incumprimento contratual da contraparte, ocasionando, assim, a extinção do contrato, tem de concluir-se que incorreu ele, desse modo, em incumprimento definitivo, equivalente à recusa perentória e definitiva de cumprir, ocasionando a perda do sinal prestado.
8. – Num tal caso, é lícita, extinta a promessa, a ulterior venda do imóvel a terceiro.
9. – Se, nesse contexto, o promitente comprador procedeu ao corte de árvores no prédio a que se refere a promessa, para além do que lhe foi consentido pela contraparte, excedendo, sem autorização, os limites permitidos, e ocasionando, assim, desvalorização do prédio no mercado imobiliário, incorre no dever de indemnizar a contraparte, até ao montante do dano provocado.