Contrato promessa de compra e venda. Prédio urbano. Licença de utilização. Impossibilidade legal. Impossibilidade objetiva. Impossibilidade originária. Nulidade do contrato

CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA. PRÉDIO URBANO. LICENÇA DE UTILIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE LEGAL. IMPOSSIBILIDADE OBJECTIVA. IMPOSSIBILIDADE ORIGINÁRIA. NULIDADE DO CONTRATO
APELAÇÃO Nº
908/17.4T8GRD.C1
Relator: LUÍS CRAVO
Data do Acordão: 12-02-2019
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA – GUARDA – JC CÍVEL E CRIMINAL – JUIZ 3
Legislação: ARTS. 204, 280, 286, 401, 410, 440 CC, DL Nº 282/99 DE 26/7
Sumário:

  1. Resulta do art. 1º, nº1, do DL nº 281/99, de 26 de Julho (na redacção introduzida pelo DL nº 99/2010, de 2 de Setembro), que é requisito fundamental da concretização da transmissão da propriedade sobre prédios urbanos, que seja certificada a existência da correspondente autorização de utilização perante a entidade que celebrar a escritura (ou autenticar o documento particular).
  2. Dada a natureza material deste requisito (já não é uma simples formalidade mas um requisito do próprio negócio imposto por lei), devem-se aplicar ao contrato promessa as regras do contrato prometido (cf. art. 410º, nº1, do C.Civil).
  3. O conceito de prédio rústico – e, logo, de prédio urbano – é um conceito jurídico e não um facto, pelo que a classificação provinda da inscrição matricial, é indiferente para efeitos da qualificação civil, que tem critérios próprios.
  4. A esta luz, a lei civil – art. 204º do C.Civil – distingue um prédio rústico de um prédio urbano com base numa avaliação casuística, tendo subjacente um critério de destinação ou afectação económica.
  5. Assim, se a terra existente e remanescente no prédio ajuizado, só formalmente era apta a cultura de sequeiro, não se evidenciando que alguma cultura com aproveitamento económico nela existisse ou fosse praticada, antes era ela um mero complemento da habitação/vivenda, constituindo aquela o logradouro desta, isto é, sendo a terra subordinada à casa/construção (à luz do conceito segundo o qual um logradouro é um espaço complementar e serventuário de um edifício, com o qual constitui uma unidade predial), tendo presente o dito critério da destinação ou afectação económica, importa concluir que se estava juridicamente perante um prédio urbano.
  6. Sendo-lhe nessa medida aplicável o dito art. 1º, nº1, do DL nº 281/99, de 26 de Julho, daí resultando que, na medida em que a vivenda, que foi prometida comprar e vender, existente no prédio ajuizado, se encontrava construída, à data desse contrato promessa (como ainda se encontra hoje), ilegalmente, sem licença de construção e sem licença de utilização, tal impõe que o Tribunal conheça e declare a nulidade (decorrente de impossibilidade objetiva e originária da prestação – art. 401º, nº1 do C.Civil) do contrato promessa de compra e venda, uma vez que o mesmo viola disposições de direito público.
  7. Sendo certo que essa nulidade, ex vi do disposto nos arts. 280º, nº1 e 286º do mesmo C.Civil, é de conhecimento oficioso. 

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