Contrato promessa de compra e venda. Impugnação de facto. Declarações de parte. Nulidade formal. Abuso de direito. Inalegalidade

CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA. IMPUGNAÇÃO DE FACTO. DECLARAÇÕES DE PARTE. NULIDADE FORMAL. ABUSO DE DIREITO. INALEGALIDADE
APELAÇÃO Nº
752/17.9T8LRA. C1
Relator: MOREIRA DO CARMO
Data do Acordão: 19-12-2018
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – LEIRIA – JC CÍVEL – JUIZ 1
Legislação: ARTS.334, 410 CC, 466, 640 CPC
Sumário:

  1. Não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objecto da impugnação for insusceptível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação, ter relevância ou suficiência jurídica para a solução da causa ou mérito do recurso, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente.
  2. As declarações de parte, de mera apreciação livre (como decorre do art. 466º, nº 3, do NCPC), desacompanhadas de outros elementos probatórios confirmatórios/clarificadores, não podem valer por si só, não tendo o condão de isoladas poderem fundar uma resposta positiva ao que o declarante afirma.
  3. Em situações excepcionais e bem delimitadas, pode decretar-se, ao abrigo do instituto do abuso de direito, a inalegabilidade pela parte de um vício formal do negócio jurídico, decorrente da preterição das normas imperativas que, com base em razões de interesse público, regem a forma do acto: porém, esta solução – que conduz ao reconhecimento do vício da nulidade, mas também à paralisação da sua normal e típica eficácia – carece de ser aplicada com particulares cautelas, não podendo generalizar-se ou banalizar-se, de modo a desconsiderar de modo sistemático o conteúdo da norma imperativa que regula a forma legalmente exigida para o acto.
  4. Em consonância com esta orientação geral, pode admitir-se a paralisação da invocabilidade da nulidade por vício de forma, com base num censurável venire contra factum proprium, quando a conduta das partes, sedimentada temporalmente, se traduziu num cumprimento do contrato, sem quaisquer focos de litigiosidade relevante, assumindo aquelas inteiramente os direitos e obrigações dele emergentes e criando, com tal estabilidade da relação contratual, a fundada e legítima confiança na contraparte em que se não invocaria o vício formal, verificado aquando da celebração do acto;
  5. É o que se verifica quando: – os RR, como promitentes vendedores, no contrato promessa, celebrado em 26.11.2015, renunciaram expressamente ao reconhecimento das assinaturas bem, como ao direito de suscitar a nulidade do contrato decorrente da sua falta, logo aí dando a entender à A., promitente compradora, que não iriam invocar essa nulidade; – por carta datada de 5.2.2016, recepcionada pela A. em 8.2.2016 a R. mulher solicitou à A. a marcação da escritura prometida no contrato em causa até ao dia 12.2.2016, ou seja, interpelam a A. à celebração da escritura pública, num “prazo recorde”, dando aí a entender que estavam muito interessados em realizar o negócio, gerando um reforço da convicção junto da contraparte A. que pretendiam concretizar o negócio prometido, e não invocar a referida nulidade; – apesar desse prazo apertadíssimo a A. logrou agendar a escritura para tal 12.2, munindo-se de todos os elementos necessários à sua efectivação, mas os RR afinal não compareceram à mesma, não obstante a terem solicitado, em tão curto prazo de tempo; – a dita intimação à realização da escritura foi feita quando a mãe da R., também interveniente na celebração do contrato promessa e cujo rogo irregular originou o vício formal do contrato, já havia falecido, o que significa que aquando da apontada intimação o rogo irregular, o vício formal do contrato, afinal não tinha importância alguma para os RR; – 10 dias depois do prazo que deram à A. para celebrar a escritura prometida, venderam o imóvel objecto do contrato promessa a um terceiro; – só na presente acção é que suscitam, pela 1ª vez, a invocação da nulidade decorrente do rogo irregular. 

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