Contrato de arrendamento. Denúncia. Senhorio. Habitação própria. Necessidade. Benfeitorias. Excesso de pronúncia. Dever de cooperação. Alteração de facto

CONTRATO DE ARRENDAMENTO. DENÚNCIA. SENHORIO. HABITAÇÃO PRÓPRIA. NECESSIDADE. BENFEITORIAS. EXCESSO DE PRONÚNCIA. DEVER DE COOPERAÇÃO. ALTERAÇÃO DE FACTO
APELAÇÃO Nº
3250/13.6TJCBR.C1
Relator: ANTÓNIO CARVALHO MARTINS
Data do Acordão: 15-11-2016
Tribunal: COMARCA DE COIMBRA – COIMBRA – JL CÍVEL – 2ª SEC
Legislação: ARTS.236, 1031,1036, 1046, 1101, 1273 CC, 7, 526, 662 CPC, LEI Nº 6/2006 DE 27/2
Sumário:

  1. O excesso de pronúncia configurar um mero vício formal – que não erro de substância ou de julgamento – traduzido em decisão para além dos poderes de cognição do julgador.
  2. A concessão ao tribunal da faculdade de tomar declarações a pessoa não indicada como testemunha, não pode servir para subverter a regras processuais relativas à indicação e produção das provas e ao princípio do dispositivo.
  3. .Como elemento de confluência, acresce que quando a lei, no art. 645.°, n.º 1, do CPC (526º NCPC), refere “no decurso da acção” deve entender-se até ao encerramento do julgamento da matéria de facto. E quando aí utiliza a expressão “o juiz deve ordenar” é de entender que se trata de um poder-dever.
  4. No âmbito do n.º 1 do art. 662º NCPC (modificabilidade da decisão de facto), integram-se as eventuais violações das regras do direito probatório, designadamente nos casos em que tenha sido considerado provado (ou não provado) certo facto, com base em meio de prova considerado insuficiente (v.g. depoimento testemunhal).
  5. No uso dos poderes relativos à alteração da matéria de facto, conferidos pelo art. 712.° do CPC (662º NCPC), a Relação deverá formar e fazer reflectir na decisão a sua própria convicção, na plena aplicação e uso do princípio da livre apreciação das provas, nos mesmos termos em que o deve fazer a 1.ª Instância, sem que se lhe imponha qualquer limitação, relacionada com convicção que serviu de base à decisão impugnada, em função do princípio da imediação da prova. O que, pelo modo indicado, se exercitou.
  6. A carência de habitação do senhorio, em determinada localidade, e a sua necessidade (real, efectiva) em matéria habitacional, sobrepõe-se à necessidade paralela ou concorrente do inquilino.
  7. É razoável que o legislador, colocado perante um conflito de direitos – de um lado, o direito à habitação do senhorio, fundado num direito real próprio, e, por outro, o direito à habitação do inquilino, fundado num contrato de arrendamento, cujo objecto é o imóvel que pertence ao senhorio -, não podendo dar satisfação a ambos os direitos, sacrifique o direito do inquilino ao direito do senhorio.
  8. A necessidade do locado para habitação própria do senhorio, enquanto requisito para a denúncia do arrendamento, pode assentar em razões de ordem psico-afectiva como sejam as que evidencia um jovem adulto que se pretende autonomizar da casa dos pais “e se viu confrontado com a necessidade de tomar de arrendamento um quarto para, precariamente, poder satisfazer a sua pretensão, por não ter mais nenhum prédio da sua propriedade que pudesse ocupar para o efeito.
  9. A necessidade de habitação tem que ser real, séria, actual ou futura, não eventual mas iminente, traduzida em razões ponderosas, não se confundindo com uma maior comodidade e deve corresponder a uma intenção séria de no locado fixar residência, devendo ser apreciada objectivamente em função das condições, vida, interesses e carências do senhorio, sob pena de se poder transformar em mero pretexto para obter a desocupação.
  10. O solteiro que dorme num quarto arrendado passa a ter necessidade de uma casa onde possa instalar o lar que vai constituir, antes mesmo da celebração do casamento.
  11. Ao comunicar, eficazmente, ao arrendatário a sua pretensão de denunciar o contrato, o locador assume a qualidade de devedor de uma “compensação” correspondente a um ano de renda. Embora a lei designe esse pagamento como “indemnização”, como as eventuais desvantagens patrimoniais causadas ao arrendatário com a desocupação do imóvel resultam do lícito exercício de um direito do locador, tal hipótese corresponderá a uma indemnização por factos lícitos.
  12. A benfeitoria consiste, no referencial do disposto no art. 216º Código Civil, como a própria palavra indica, no melhoramento ou aperfeiçoamento da coisa, feito por quem a ela está ligado em consequência de uma relação ou vínculo jurídico, por exemplo, posse, locação, comodato, usufruto,
  13. A construção de quarto de banho ou a sua renovação, ou melhor adequação a condições normais e indispensáveis de salubridade, na casa objecto do contrato, sempre constitui – no mínimo – benfeitoria útil, pois a ter em vista melhorar as condições de habitabilidade da casa e não evitar a sua perda ou destruição.
  14. As obras realizadas em prédio alheio, consistentes na reparação do telhado e na substituição de parte da telha antiga com a finalidade de evitar a infiltração da água das chuvas, constituem benfeitorias necessárias.

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