Apreensão. Validação da apreensão pela autoridade judiciária. Nulidade da apreensão por falta de validação. Arma de fogo. Arma desactivadas. Certificado de desactivação. Omissão de pronúncia. Enumeração dos factos provados e não provados. Factos relevantes para a decisão. Perda de instrumentos. Produtos e vantagens. Fundamentação da decisão de perdimento
APREENSÃO. VALIDAÇÃO DA APREENSÃO PELA AUTORIDADE JUDICIÁRIA. NULIDADE DA APREENSÃO POR FALTA DE VALIDAÇÃO. ARMA DE FOGO. ARMA DESACTIVADAS. CERTIFICADO DE DESACTIVAÇÃO. OMISSÃO DE PRONÚNCIA. ENUMERAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS E NÃO PROVADOS. FACTOS RELEVANTES PARA A DECISÃO. PERDA DE INSTRUMENTOS. PRODUTOS E VANTAGENS. FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DE PERDIMENTO
RECURSO CRIMINAL Nº 43/19.0T9PMS.C1
Relator: LUÍS TEIXEIRA
Data do Acórdão: 26-04-2023
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO CENTRAL CRIMINAL DE LEIRIA – JUIZ 3
Legislação: LEI N.º 5/2006, DE 23 DE FEVEREIRO; LEI N.º 50/2019, DE 24 DE JULHO; ARTIGOS 119.º A 121.º, 178.º, N.º 6, 368.º, N.º 2, E 374.º, N.º 2, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL; ARTIGO 109.º, N.º 1, DO CÓDIGO PENAL
Sumário:
I – A falta de validação, por parte da autoridade judiciária, da apreensão feita pelo órgão de polícia criminal, não integrando o elenco das nulidades insanáveis constante do artigo 119.º do Código Processo Penal, nem sendo cominada como tal no artigo 178.º, n.º 6, do mesmo diploma, deve considerar-se uma nulidade sanável, sujeita ao regime dos artigos 120.º e 121.º do Código Processo Penal.
II – Apenas com o artigo 11.º-B da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, introduzido pela Lei n.º 50/2019, de 24 de Julho, que veio a consignar que a certificação ou reconhecimento de arma desativada determina a sua reclassificação automática em arma da classe G, foi tratada expressamente a questão da desactivação das armas de fogo e respectiva certificação.
III – Em 2017 ainda não estava regulamentada a certificação da desactivação, mas também não estava legalmente prevista na legislação interna nacional a classificação das armas em causa como armas da classe G), o que significa que tais armas, ainda que já intervencionadas a fim de serem desactivadas, não estavam legalmente reconhecidas nem certificadas como desactivadas.
IV – Os factos provados e não provados que, nos termos do n.º 2 do art. 374.º do Código de Processo Penal, devem constar da fundamentação da sentença são os factos referidos no n.º 2 do artigo 368.º.
V – Para este efeito são factos relevantes os que integrem os pressupostos do crime imputado ao agente, cuja indiciação determinou a dedução de acusação e a realização do julgamento, os que integrem causas de exclusão da ilicitude ou da culpa e os que influenciem a escolha e medida da pena.
VI – Os factos julgados provados devem ser enumerados especificada e metodicamente, para evitar dúvidas sobre se o tribunal julgou provado ou não um determinado facto, rigor não é de exigir e aplicar à enumeração dos factos julgados não provados, apenas se exigindo quanto a estes que resulte inequívoco que o tribunal apreciou, analisou e se pronunciou sobre todos os factos relevantes submetidos ao seu julgamento.
VII – Quando na contestação se alegue, com clareza e articulação, factos relevantes para a decisão, quer tendo por base a natureza do crime em causa, quer os eventuais efeitos na determinação da sanção, exige-se que o julgador se pronuncie expressamente sobre eles de forma expressa e inequívoca, seguindo o texto da respetiva contestação, elencando como factos provados ou não provados cada um deles de entre os que efetivamente são relevantes.
VIII – Não existindo uma relação causal e imediata entre a prática do crime e a declaração de perda dos instrumentos de facto ilícito típico, esta declaração deve ser apreciada à luz do artigo 109.º, n.º 1, do Código Penal, nos termos do qual são pressupostos para a declaração da perda que o objecto tenha servido para a prática de facto ilícito ou estivesse destinado a servir para a sua prática, que pela sua natureza ou pelas circunstâncias do caso ponha em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem públicas, ou que ofereça sério risco de ser utilizado para o cometimento de novos factos ilícitos típicos.
IX – Sem prejuízo de os objectos apreendidos serem armas e munições e da condenação pela prática do crime de detenção de arma proibida, o julgador não está dispensando de apreciar e fundamentar a perda dos bens a favor do Estado à luz dos pressupostos exigidos pelo artigo 109.º, n.º 1, do Código Penal, ainda que a condenação e as caraterísticas dos concretos objectos apontem para a verificação dos pressupostos legalmente exigidos por aquela disposição.