Acidente de viação. Culpa e risco. Dano de morte e danos morais

ACIDENTE DE VIAÇÃO RESPONSABILIDADE CIVIL CONCORRÊNCIA ENTRE RESPONSABILIDADE CIVIL COM BASE NA CULPA E RESPONSABILIDADE ASSENTE NO RISCO DANO MORTE E DANOS MORAIS
APELAÇÃO n.º 801/2002.C1
Relator: DR. TELES PEREIRA
Data do Acordão: 03/06/2008
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE OURÉM – 2º JUÍZO
Legislação Nacional: ARTºS 496º, NºS 1 E 3; 503º, NºS 1 E 3; 505º; 570º, Nº 1, DO C. CIV.
Sumário:

  1. Resultando uma decisão da prova concreta de determinados factos, e não do funcionamento, enquanto “regras de decisão” respeitantes à incerteza quanto a esses factos, das regras respeitantes ao ónus da prova, é irrelevante a parte de quem provém a prova desses factos.
  2.  A formulação de um juízo de culpa, enquanto elemento de uma imputação delitual espeitante à circulação automóvel, assenta na aferição da conduta do agente com base na antecipação preventiva dos riscos normais da condução e não de riscos excepcionais, referidos a um exacerbamento de cautelas para além daquilo que usualmente, naquelas condições concretas, é suficiente para evitar acidentes.
  3. Numa acção destinada à efectivação da responsabilidade civil por acidente de viação, é o próprio acidente, enquanto evento juridicamente plurissignificativo, que integra a causa de pedir, sendo de presumir que ao aludir a uma responsabilidade assente na culpa, exclusiva ou concorrente, do lesante, o demandante não exclui a responsabilidade pelo risco.
  4. No caso de um veículo pesado de circulação terrestre, a responsabilidade pelo risco, referida a quem detém a “direcção efectiva” do mesmo (artigo 503º, nº 1 do CC), abrange as características desse tipo de veículo potenciadoras da magnitude do dano.
  5. Tal responsabilização subsiste, relativamente a quem detém a “direcção efectiva” e, como tal, controla a utilização desse meio, mesmo face à prova da ausência de culpa por parte do condutor (artigo 503º, nº 3 do CC), sempre que o dano expresse (ainda expresse), na sua natureza ou intensidade, elementos ligados à particular natureza desse veículo.
  6. Actua nestes casos, na ponderação das contribuições para o dano, em sede de fixação do quantum indemnizatório, o disposto no artigo 570º, nº 1 do CC.
  7. A exclusão da responsabilidade objectiva do detentor do veículo, nos termos do artigo 505º do CC, só ocorre quando o acidente for unicamente devido ao próprio lesado ou a terceiro, ou resulte em exclusivo de causa estranha ao funcionamento do veículo, não tendo em nada contribuído a particular natureza deste para a ampliação dos danos.
  8.  Apreciando o dano morte, ponderando o sentido significativo do mesmo, enquanto dano respeitante a um valor, necessariamente idealizado, correspondente à supressão da vida da própria vítima, que se transmite aos seus herdeiros, nos termos do artigo 2024º do CC, considera-se adequado quantificá-lo em € 30.000,00.
  9. Quanto ao dano não patrimonial do A. (artigo 496º, nº 1 do CC), traduzido no desgosto correspondente à morte trágica da mãe, pessoa de 60 anos de idade, activa, alegre, vigorosa e sempre disponível para ajudar os filhos, que a ela estavam muito ligados, considera esta Relação adequado, funcionando aqui o critério da fixação equitativa (artigo 496º, nº 3 do CC), o montante de € 9.000,00.