Interdição. Incapacidade acidental
INTERDIÇÃO. INCAPACIDADE ACIDENTAL
APELAÇÃO Nº 469/2000.C1
Relator: DR. JAIME FERREIRA
Data do Acordão: 10-03-2009
Tribunal: ÁGUEDA – 2ºJUÍZO
Legislação: ARTºS 138º, 148º, 150º, 153º E 257º DO C.CIV.
Sumário:
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Um dos casos de incapacidade negocial do exercício é a interdição, instituto que tem por escopo a protecção do próprio interdito, enquanto maior que, por anomalia psíquica (o que abrange deficiências do intelecto, da afectividade ou da vontade), surdez-mudez ou cegueira, levam, pela sua gravidade, à inaptidão para reger a sua pessoa e bens (art. 138º do Código Civil).
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No que às primeiras concerne, cabem não apenas um descalabro demencial propriamente dito, isto é, uma psicose adquirida, como igualmente a psicose congénita, ou seja, os chamados estados oligofrénicos (cretinismo, idiotia, imbecilidade), em que a pessoa nunca chegou a atingir o desenvolvimento normal.
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Caso a anomalia psíquica se traduza numa simples fraqueza de espírito do incapaz, então estaremos perante uma eventual situação de inabilitação do incapaz.
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Como tal, e na medida em que seja decretada, apenas abrange os actos de disposição entre vivos e aqueles que forem especificados na sentença, consideradas as circunstâncias concretas do caso (art. 153º do Código Civil), podendo mesmo ser retirada a administração dos próprios bens e entregue a um curador (art. 154º do mesmo diploma legal).
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No que concerne o valor dos actos praticados pelo interdito, importa distinguir três momentos essenciais: se posteriores ao registo da sentença de interdição definitiva (art. 1920º-B do Código Civil, aplicável ex vi do art. 147º do mesmo diploma legal, al. g) do n.º 1 do art. 69º e art. 78º do Código de Registo Civil), estamos perante actos anuláveis, vício invocável nos termos do art. 125º, aplicável ex vi art. 138º do Código Civil (art. 148º do Código Civil); se praticados na pendência do processo de interdição, isto é, entre a publicação dos anúncios previstos no art. 945º do Código de Processo Civil e o registo da sentença de interdição definitiva, serão anuláveis se considerados prejudiciais numa apreciação reportada ao momento da prática do acto (art. 149º do Código Civil e nº 2 do art. 956º do Código de Processo Civil); já os actos praticados antes da publicidade da acção, há que atender ao disposto relativamente à incapacidade acidental (art. 150º do Código Civil).
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A incapacidade acidental, prevista e regulada no artigo 257º do Código Civil, exige, para a anulabilidade do acto, que, no momento da prática do actos, haja uma incapacidade de entender o sentido da declaração negocial ou falte o livre exercício da vontade; e que a incapacidade natural existente seja notória ou conhecida do declaratário (passível de apreensão por uma pessoa média, colocada na posição do declaratário), assim se tutelando a boa-fé deste último e a segurança jurídica.
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Estando assente que o A… foi declarado interdito por sentença datada de 31.01.2000, e que o negócio de compra e venda em causa nos autos foi celebrado em 25.09.1996, portanto muito antes da publicitação da acção (que remonta a 1998), ao caso é aplicável o regime da incapacidade acidental (arts. 257º e 150º do Código Civil).
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Sendo assim, o que importa saber é se o referido A…, à data da outorga da escritura de compra e venda em discussão, se encontrava ou não incapacitado de entender o sentido da declaração negocial que por si foi proferida (a venda de um imóvel próprio, pelo preço dito acordado e como por ele já recebido) e se tal incapacidade era notória ou conhecida do declaratário (o comprador), devendo entender-se como incapacidade notória aquela que uma pessoa de normal diligência poderia logo notar.
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A anulabilidade (dos negócios jurídicos levados a cabo pelos interditos anteriormente à publicidade da acção) tem, como condições necessárias e suficientes, os seguintes requisitos: 1) que, no momento do acto, haja uma incapacidade de entender o sentido da declaração negocial ou falte o livre exercício da vontade; 2) que a incapacidade natural existente seja notória ou conhecida do declaratário (contraparte nos contratos, destinatário da declaração nos negócios unilaterais receptícios, destinatário dos efeitos da declaração nos negócios unilaterais não receptícios).
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O nº 2 do artº 257º esclarece que notório é um facto que uma pessoa de normal diligência teria podido notar… Para a anulabilidade destes actos não basta a prova da incapacidade natural, exige-se igualmente, para tutela da boa fé do declaratário e da segurança jurídica, a prova da cognoscibilidade da incapacidade.