Contrato-promessa de compra e venda. Bem imóvel da sociedade

CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA. PROMESSA DE VENDA. NULIDADE DO CONTRATO. PROPRIEDADE HORIZONTAL. CONSTITUIÇÃO. ALIENAÇÃO. BEM IMÓVEL. SOCIEDADE. DÍVIDA. SÓCIO. VÍCIOS. VONTADE. SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
APELAÇÃO Nº 228/04.4TBILHV.C1
Relator: DRª SÍLVIA PIRES 
Data do Acordão: 03-03-2009
Tribunal: ÍLHAVO – 1º JUÍZO
Legislação: ARTºS 236º, Nº 2, 280º, Nº 1, E 829º-A, DO C.CIV.; 6º, Nº 2, E 246º, Nº 2, AL. C), DO CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS.
Sumário:

  1. Incidindo o direito de propriedade sobre a totalidade das coisas que constituem o seu objecto, não podem as suas partes integrantes ou componentes ser objecto de direito de propriedade de titular diferente, sendo o destino jurídico da coisa unitário.
  2. Daí que para se proceder à venda de parte concreta de edifício seja necessário constituí-lo previamente em propriedade horizontal, podendo posteriormente proceder-se à venda individualizada das suas fracções autónomas.
  3. Isso, no entanto, não impede que se celebre contrato-promessa de compra e venda de parte de edifício, correspondente a fracção autónoma após posterior submissão daquele prédio ao regime de propriedade horizontal, considerando os efeitos meramente obrigacionais daquele negócio jurídico.
  4. Este contrato-promessa só será nulo se for impossível a constituição do edifício em propriedade horizontal de modo a permitir a individualização da parte prometida vender como fracção autónoma, pois, nesse caso, o seu objecto será impossível – artº 280º, nº 1, do C. Civ.
  5. A constituição de um edifício em propriedade horizontal exige, como requisito de interesse público, que a administração pública verifique e certifique a possibilidade do mesmo ser dividido nas fracções pretendidas, de modo a que seja viável a sua utilização para o fim a que estão destinadas.
  6. O acto de alienação de imóveis de uma sociedade integra o núcleo de competência relativamente exclusiva dos sócios, donde resulta que se o pacto social não dispuser de outro modo, só eles poderão decidir sobre a alienação de bens imóveis da sociedade, não podendo os gerentes, sem estarem cobertos por essa deliberação prévia, praticar tal acto por sua iniciativa – artº 246º, nº 2, al. c), do Código das Sociedades Comerciais.
  7. Sendo o contrato-promessa de alienação de um bem imóvel duma sociedade um acto negocial preparatório daquele acto de alienação, integra também a referida reserva relativa dos sócios, pelo que os gerentes não poderão praticá-lo em nome da sociedade sem os sócios terem decidido a sua outorga.
  8. Porém, a falta de deliberação em Assembleia Geral sobre a alienação do bem imóvel prometido vender não afecta a validade nem a eficácia do contrato-promessa celebrado, desde que todos eles intervenham no mesmo em representação da sociedade.
  9. O nº 2 do artº 6º do C. S.C. dispõe que as liberalidades que possam ser consideradas usuais, segundo as circunstâncias da época e as condições da própria sociedade, não são havidas como contrárias ao fim desta, pelo que a capacidade jurídica das sociedades comerciais, apesar do seu escopo lucrativo, compreende a prática de actos gratuitos, desde que estes possam ser incluídos numa prática generalizada habitual por parte das sociedades comerciais.
  10. O pagamento de dívidas dos sócios pela sociedade embora não possa ser considerado uma prática usual, também não deve ser excluído, sem mais, dos “fins” das sociedades comerciais.
  11. Na verdade, se a primeira finalidade duma sociedade comercial é a obtenção de lucro, a última finalidade é a sua distribuição pelos sócios, e esta distribuição tanto pode ser efectuada através da entrega de receita, como de bens da sociedade, conforme resulta do disposto nos artºs 31º e 32º do C.S.C., assim como pode essa entrega ser efectuada por transmissão directa do património da sociedade para o património dos seus sócios, como por transmissão para o património de terceiros credores desses sócios, com o acordo destes, para liquidação das suas dívidas.
  12. A divergência bilateral e consensual entre a vontade e a declaração, sem que se revele que essa divergência procure enganar terceiros, é uma questão que deve ser resolvida no âmbito da interpretação dos negócios jurídicos, tendo inteira aplicação a regra constante do artº 236º, nº 2, do C. Civ., segundo a qual o contrato deve valer com o sentido correspondente ao da vontade real das partes.
  13. A sanção pecuniária compulsória prevista no nº 1 do artº 829º-A, do C.Civ., apenas está prevista como instrumento de coacção ao cumprimento de obrigações de prestação de facto e não de entrega de coisa.

Consultar texto integral