Direito de preferência. Prédio misto. Prevalência. Prédio urbano. Exclusão do direito
DIREITO DE PREFERÊNCIA. PRÉDIO MISTO. PREVALÊNCIA. PRÉDIO URBANO. EXCLUSÃO DO DIREITO
APELAÇÃO Nº 22/08.3TBFND.C1
Relator: TELES PEREIRA
Data do Acordão: 15-03-2011
Tribunal: FUNDÃO – 2º JUÍZO
Legislação: ARTºS 1380º, Nº 1; 1381º, AL. A) DO CC E 18º DO DECRETO-LEI Nº 384/88, DE 25 DE OUTUBRO.
Sumário:
- A funcionalidade do conceito de “quinta”, enquanto realidade qualificada como “prédio misto”, envolvendo a existência de uma casa (parte urbana) e de uma parcela de terreno, mais ou menos ampla, dotada de aptidão para o cultivo (parte rústica), traduz, alternativamente, a preponderância, na afectação desse espaço pelo seu dono, do elemento urbano ou do elemento rústico.
- No primeiro caso (preponderância do elemento urbano) sobressai a finalidade de habitar um espaço (a casa) que associa, através do uso dos terrenos circundantes, alguns elementos rurais.
- No segundo caso (preponderância do elemento rústico referido aos terrenos aptos ao cultivo) sobressai a ideia de uma exploração agrícola associada a uma casa.
- Existindo separação registal da casa (correspondente a um artigo matricial urbano) relativamente ao terreno circundante (correspondente este a um artigo matricial rústico), o exercício do direito de preferência, por um vizinho proprietário de um prédio confinante visando o emparcelamento fundiário, previsto nos artigos 1380º, nº 1 do CC e 18º do Decreto-Lei nº 384/88, de 25 de Outubro, não pode prescindir da consideração unitária da realidade que corresponde à associação, no prédio objecto da preferência, dos dois elementos (prédio rústico/prédio urbano), sendo esta ligação que dá expressão autónoma ao conceito de “quinta”.
- Assim, quando prevalece, na afectação conferida àquele espaço (integrado na matriz por um prédio urbano e por um prédio rústico) o elemento urbano, designadamente através da afectação do prédio a um fim habitacional, o exercício desse direito de preferência está excluído, nos termos da alínea a) do artigo 1381º do CC, pois a parte formalmente qualificada de rústica passa a assumir a natureza de parte componente de um prédio urbano (poderá mesmo ser vista como um logradouro deste, por referência ao segundo trecho do nº 2 do artigo 204º do CC) e o prédio, em si mesmo (parte rústica e urbana), deve ser considerado como afecto a um fim que não é a cultura (aqui significando actividade agrícola).
- Se, pelo contrário, na afectação de todo o prédio, prevalecer o elemento traduzido na exploração da parte rústica, o exercício do direito de preferência com essa base (a preferência real prevista no artigo 1380º, nº 1 do CC) deve incidir sobre todo o prédio (sobre toda a “quinta”).
- O exercício de um direito de preferência que, incidindo exclusivamente sobre a parte rústica de um prédio misto, determine a diminuição do valor da parte urbana desse prédio, induz uma situação de desequilíbrio no exercício desse direito de preferência, implicando a actuação deste com lesão intolerável de outra pessoa (o sujeito passivo da preferência).
- O desvirtuar, através do exercício dessa mesma preferência, da realidade unitária que caracteriza e fornece identidade à “quinta”, despojando-a do elemento correspondente ao “prédio rústico”, sempre traduziria o exercício desse direito de preferência sem consideração por uma situação especial merecedora de tutela.
- Qualquer uma destas consequências (as enunciadas em VII e VIII deste sumário) bloquearia, por razões de justiça e de compatibilização de direitos, o exercício de um direito de preferência visando o emparcelamento fundiário.