Acidente de viação. Indemnização. Declaração de rendimentos

ACIDENTE DE VIAÇÃO. INDEMNIZAÇÃO. DECLARAÇÃO DE RENDIMENTOS. ABUSO DE DIREITO
APELAÇÃO Nº
170/1995.C1
Relator: GREGÓRIO JESUS
Data do Acordão: 23-02-2010
Tribunal: VARA DE COMPETÊNCIA MISTA DE COIMBRA 
Legislação: ARTº 67º, Nº 7, DO DEC. LEI Nº 291/2007, DE 21/08, NA REDACÇÃO DO DEC. LEI Nº 153/2008, DE 6/08; 334º DO C. CIV.; ARTº 6º, Nº 1, DO DEC. LEI Nº 522/85, DE 31/12.
Sumário:
  1. Na jurisdição cível não há que conferir uma presunção de veracidade inilidível às declarações de rendimentos e lucros apresentados ao Fisco; esses documentos somente provam que se declararam os rendimentos que delas constam, não que tais rendimentos tenham sido os efectivamente auferidos pelo contribuinte.
  2. Mediante a redacção conferida ao artº 67º, nº 7, do Dec. Lei nº 291/2007, de 21/08, pelo Dec. Lei nº 153/2008, de 6/08, dispôs-se que “para efeitos de apuramento do rendimento mensal do lesado no âmbito da determinação do montante da indemnização por danos patrimoniais a atribuir ao lesado, o tribunal deve basear-se nos rendimentos líquidos auferidos à data do acidente que se encontrem fiscalmente comprovados, uma vez cumpridas as obrigações declarativas relativas àquele período, constantes de legislação fiscal”.
  3. O citado preceito limita os meios de prova relativos aos rendimentos auferidos quando esteja em causa a fixação de uma indemnização por acidente de viação. Retira às partes a possibilidade que até aí dispunham de provar o valor dos seus rendimentos por outros meios de prova para além da declaração fiscal – é uma norma de direito probatório especial, apenas aplicável aos factos posteriores à sua entrada em vigor.
  4. Com a reprovação do abuso de direito visa-se obviar ao exercício anormal de um direito próprio, sancionando os excessos, em termos reprováveis, do seu exercício, só formalmente adequado ao direito objectivo.
  5. Na vertente do chamado venire contra factum proprium traduz-se o abuso do direito na conduta contraditória ou seja, na conduta anterior do seu titular que, objectivamente interpretada no confronto da lei, da boa fé e dos bons costumes, gerou a convicção na outra parte de que o direito não seria por aquele exercido e, com base nisso, programou a sua actividade.
  6. O prescrito no artº 6º, nº 1, do Dec. Lei nº 522/85, de 31/12, deve ser interpretado como estabelecendo dois limites: um limite genérico mais dilatado, por sinistro, havendo uma pluralidade de acidentados, que visa acautelar os interesses dos vários lesados perante a probabilidade, natural, de haver maiores danos; um outro limite, mais contido, sempre que se esteja perante um único lesado, limite esse que afora o caso dos acidentes causados por transportes colectivos e para os ocorridos no decurso de provas desportivas, só acabou com a entrada em vigor do DL nº 3/96, de 25/01.
  7. Clarificando este segundo limite, diga-se que mesmo em caso de pluralidade de lesados, em que o valor do capital obrigatoriamente seguro é de Esc. 20.000.000$00, nunca o montante devido a um só lesado pode ir além de Esc. 12.000.000$00.
  8. A obrigação de indemnização da seguradora é uma obrigação pecuniária, pois que tem por objecto uma prestação em dinheiro, visando proporcionar ao credor o valor que a respectiva espécie possui como tal – princípio nominalista.
  9. A prestação a que a segurado se obrigou não pode ser alvo de qualquer actualização (pelo que é irrelevante o grau de inflação monetária que porventura ocorra no período que medeia entre o momento em que a obrigação da seguradora se tornou eficaz, por preenchimento da respectiva condição, e o momento em que é prestada).