Seguro obrigatório. Actividade desportiva. Sua abrangência  

Seguro obrigatório. Actividade desportiva. Sua abrangência      

Apelação n.º 165/06.8TBGVA.C1   
Relator: DR. TELES PEREIRA
Data do Acórdão:08/09/2009
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE GOUVEIA
Legislação Nacional: DEC. LEI Nº 146/93, DE 26/04 E DEC. LEI Nº 10/2009, DE 12/01.          
Sumário:
  1. O controlo pelo Tribunal da Relação da matéria de facto fixada na primeira instância, com base no acesso à gravação áudio dos depoimentos aí prestados, dirige-se à detecção de manifestos erros de julgamento, não se traduzindo numa substituição da "livre apreciação" racionalmente justificada da prova testemunhal feita pelo Tribunal a quo, pela "livre apreciação" do Tribunal ad quem.
  2. O Dec. Lei nº 146/93, de 26/04 (entretanto substituído pelo Dec. Lei nº 10/2009, de 12/01), sujeitou a cobertura dos riscos de acidentes pessoais inerentes à actividade desportiva ao regime de seguro obrigatório.
  3. A circunstância deste "seguro obrigatório da actividade desportiva" abranger acidentes in itinere para os treinos e as competições implica que a obrigação de segurar se refere à actividade desportiva em sentido amplo, abrangendo actividades preambulares e sequenciais do treino e da competição.
  4. O regime legal deste seguro abrange, obrigatoriamente, enquanto cobertura mínima, além da indemnização por morte, a indemnização por invalidez, total ou parcial, sem qualquer limitação percentual (artºs 4º do DL 146/93 e 5º do DL 10/2009), significando isto que qualquer percentagem de desvalorização funcional permanente estará, obrigatoriamente, coberta pelo seguro.
  5. Uma cláusula inserta num contrato de seguro desportivo que cubra a obrigação de segurar estabelecida na lei (e que, por isso, se traduz num "seguro obrigatório") não pode excluir a indemnização de desvalorizações funcionais permanentes inferiores a 10%.
  6. A nulidade desta cláusula (artº 294º CC) resolve-se com a projecção directa no contrato da norma imperativa (no caso o artº 4º do DL 146/93) que manda indemnizar todas as incapacidades permanentes gerais, a qual passa a "integrar" o contrato, em substituição do trecho violador dessa disposição legal, aproveitando-se o restante da cláusula e do contrato.
  7.  Corresponde esta substituição à primazia da ideia de conservação do negócio contendo cláusulas nulas, através da chamada "eficácia mediata das normas imperativas", funcionando esta como "outra solução", alternativa à nulidade (à supressão do negócio ou da cláusula nula), resultante da lei (trecho final do artº 294º CC).
  8. O DL nº 146/93, no seu artº 4º, nº 1, al. a), ao referir a cobertura mínima abrangida pelo seguro desportivo de grupo ao "pagamento de um capital por morte ou invalidez permanente, total ou parcial, por acidente decorrente da actividade desportiva", não contém qualquer restrição aos danos patrimoniais resultantes do acidente quanto à incidência obrigatória do seguro (rectius, não contém qualquer exclusão de danos não patrimoniais).
  9. A inexistência de uma cláusula, num contrato referido à obrigação de segurar emergente do DL 146/93, que contenha uma expressa exclusão da cobertura de danos não patrimoniais, deve ser entendida, de acordo com a regra in dúbio contra stipulatorum, própria da interpretação de um contrato de seguro, como cobertura deste tipo de danos.

 

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