Acidente de viação. Responsabilidade pelo risco. Indemnização. Dano não patrimonial. Dano patrimonial. Alimentos

ACIDENTE DE VIAÇÃO. RESPONSABILIDADE PELO RISCO. INDEMNIZAÇÃO. DANO NÃO PATRIMONIAL. DANO PATRIMONIAL. ALIMENTOS
APELAÇÃO Nº
1685/15.9T8CBR.C1
Relator: MOREIRA DO CARMO
Data do Acordão: 21-02-2018
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – COIMBRA – JC CÍVEL – JUIZ 2
Legislação: ARTS.483, 494, 495, 496, 503, 506, 563, 566, 2003, 2004, 2009 CC
Sumário:

  1. No ordenamento jurídico nacional vigora o princípio da livre apreciação da prova pelo juiz, plasmado nos arts. 607º, nº 5, 1ª parte, e 663º, nº 2, do NCPC, decidindo o Juiz segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto;
  2. Nesta apreciação livre há que ressalvar que o tribunal não pode desrespeitar as máximas da experiência, advindas da observação das coisas da vida, os princípios da lógica, ou as regras científicas.
  3. Na responsabilidade pelo risco, nada de relevantemente diferenciado se mostrando apurado quanto à concreta dinâmica do acidente, é de fixar em graus diferenciados a percentagem dos riscos de circulação próprios de veículos dotados de características estruturais diferentes, dada a maior apetência do veículo de maiores dimensões para, em caso de colisão, provocar lesões graves nos demais utentes das vias públicas, que utilizem veículos de menor peso e dimensões; designadamente um embate entre um veículo ligeiro e uma bicicleta;
  4. Considerando que os 4 factores a que a 1ª instância atribuiu relevo diferenciador, tais como a perda de prioridade, corpulência do falecido, substância ilícita (canábis) e reduzida visibilidade, não têm relevância no caso concreto, e a matéria apurada, designadamente as velocidades de circulação 42 a 48 km para o veículo ligeiro e 10 a 13 km para o velocípede, a diferença objectiva de dimensão e peso de cada um, com as consequentes diferentes massas de embate (muito mais grave da parte do ligeiro), o pouco relevo derivado de o ciclista ser portador de um capacete de protecção de ciclista em casos de projecção contra o solo ou rails metálicos da estrada, o facto de o mesmo circular com uma taxa de álcool, embora em grau diminuto de 0,44 g/l, e o facto de circular num velocípede, veículo de características instáveis, entende-se que a contribuição do risco de cada um para os danos produzidos deve ser repartida na proporção de 70% para o ligeiro e 30 % para o velocípede;
  5. Em termos de busca e fixação do valor dos danos advenientes da responsabilidade civil extracontratual (morais/patrimoniais) os princípios da igualdade e da unidade do direito e o valor da previsibilidade da decisão judicial vinculam à padronização e à normalização do valor da indemnização;
  6. Mostra-se aceitável a quantia de 65.000 € para ressarcir a perda do direito à vida de fenecido com 44 anos, saudável, trabalhador e feliz na sua vida familiar;
  7. Para ressarcir o dano não patrimonial ante morte torna-se necessário provar no mínimo a ocorrência de dores, ou sofrimento, ou a consciência da possibilidade do decesso;
  8. A determinação do quantum da indemnização do dano não patrimonial deve orientar-se por uma valoração casuística, orientada por critérios de equidade;
  9. A indemnização destinada a ressarcir os danos não patrimoniais sofridos por um qualquer lesado não deve revestir carácter miserabilista, nem esquecer o aumento regular dos seguros obrigatórios estradais, e dos respectivos prémios, justificantes do aumento das indemnizações;
  10. Mostra-se adequado o montante de 30.000 € mil euros para ressarcir o dano não patrimonial de viúva do falecido, provando-se que com ele mantinha uma boa relação de afecto e era feliz, projectavam ter filhos em breve, e sofreu profundo desgosto e abalo psicológico, passando por fase de tristeza, angústia, e sentimento de perda, sendo casada com aquele há cerca de 1 ano e 2 meses;
  11. O exercício do direito de indemnização, excepcionalmente reconhecido no art. 495º, nº 3, do CC, àqueles que podiam exigir alimentos ao lesado, designadamente o cônjuge sobrevivo, não carece da prova de que na data do acidente de viação recebia alimentos do falecido ou estava em condições de os receber, bastando, para tal efeito, que demonstre que à data do facto danoso estava em situação de legalmente exigir os alimentos.

Consultar texto integral