Abuso de direito. Modalidade de suppressio
ABUSO DE DIREITO. MODALIDADE DE SUPPRESSIO
APELAÇÃO Nº 4472/18.9T8VIS-A.C1
Relator: SÍLVIA PIRES
Data do Acordão: 24-11-2020
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU – JUÍZO DE EXECUÇÃO DE VISEU – JUIZ 2
Legislação: ARTº 334º DO C. CIVIL.
Sumário:
- O termo suppressio é a tradução latina proposta por Menezes Cordeiro, na sua tese de doutoramento “Da boa fé no direito civil”, da figura da Verwirkung do direito alemão, a qual conheceu as suas primeiras manifestações no último quartel do século XIX, ainda em tempos anteriores à entrada em vigor do B.G.B.
- Com essa designação pretende-se abarcar as hipóteses em que, devido ao titular de um direito não o ter exercido durante um lapso de tempo significativo, as circunstâncias que rodearam essa inação criaram na contraparte a confiança que o mesmo já não viria a ser exercido, merecendo essa confiança a proteção da ordem jurídica através de um impedimento a esse exercício tardio ou da atribuição à contraparte de um direito subjetivo obstaculizador (a surrectio, como tradução latina da Erwirkung alemã, e que constitui com a suppressio as duas faces da mesma moeda).
- Fruto da teorização desta figura no direito português, introduzida por Menezes Cordeiro, a mesma tem vindo a ser objeto de profusa equação nos tribunais desde os últimos anos do século XX, invocando as mais diversas decisões que ponderaram a sua aplicação, em diferentes situações, o instituto do abuso de direito, consagrado no art.º 334º do C. Civil.
- É opinião corrente entre nós que a suppressio abrange situações próximas ou que constituem uma modalidade da figura do venire contra factum proprio, em que o exercício de um direito se revela contraditório com um anterior comportamento de inação prolongada, que, atentas as circunstâncias que caracterizam o caso concreto, induzem o sujeito obrigado por esse direito a, legitimamente, confiar que o mesmo já não será exercido, pelo que a sua ativação ofende os ditames da boa fé.
- Costumam ser enunciados como requisitos de aplicação desta figura: – um não exercício prolongado do direito; – uma situação de confiança daí derivada para a contraparte, coadjuvada por elementos circundantes que a sustentem; – uma justificação para essa confiança; – um investimento de confiança; – a imputação ao não exercente da confiança criada.
- Note-se que estes pressupostos não são necessariamente cumulativos, processando-se a sua articulação dentro dos mecanismos de uma sistemática móvel, ou seja, a falta de algum ou alguns deles pode ser suprida pela especial intensidade que assumam os restantes.
- Relativamente à prescrição dos direitos, a suppressio, tendo em comum o pressuposto da inércia do titular do direito durante um significativo período de tempo, afasta-se destas figuras ao depender da existência de um concreto investimento de confiança por parte do devedor para operar.